O ano é 2007 e a data 24 de maio. Beyoncé estreia-se em Portugal no Pavilhão Atlântico e a organização está em pânico porque os bilhetes ainda não esgotaram. O que hoje levaria horas (?), há 16 anos levou meses. Aliás, a notícia de antecipação publicada pelo Diário de Notícias no próprio dia é elucidativa: “até agora foram vendidos cerca de 14 mil bilhetes para o concerto. A organização promete a maior produção de sempre no espaço do Pavilhão Atlântico e espera lotação esgotada”. Uma produção de mais de 200 pessoas e cem mil toneladas de material técnico, transportados por dez autocarros e 15 camiões.
Resumindo e concluindo: o investimento é elevado e retorno só com casa cheia. Até porque o preço dos bilhetes é irrisório para padrōes actuais: 30 euros (balcão 2), 35 (plateia) e 42 (balcão 1). É um período de grande afirmação de uma nova vaga pop: Beyoncé, Rihanna, Lady Gaga (que dois anos depois vem pela primeira vez a Portugal na mesma sala) e Katy Perry. Enquanto latina, Shakira corre por fora. Há Christina Aguilera, Jennifer Lopez, Anastacia e Kylie Minogue (que em 2009 será um dos maiores fiascos de bilheteira da actual Altice Arena e da respectiva promotora) a perder o comboio da pop. E há Madonna, ainda rainha incontestada, mas já a sentir o chão a fugir-lhes dos pés, isto é a ter de correr atrás das mais novas.
Por isso, a primeira vez de Beyoncé já é de uma estrela pop universal mas ainda a caminho de ser Rainha. E se o regresso dois anos depois, não traz grandes alteraçōes no estatuto, as duas noites de 2014 – a segunda com Jay-Z nos camarins e em palco – são de coroação da maior figura pop do século. Algo que em 2007 já era previsível. Até porque a transversalidade de Beyoncé era não resultava apenas de singles ubíquos como Crazy In Love, doces irresistíveis como Déjà Vu ou de pérolas lascivas como Naughty Girl, mas também de um processo de credibilização pop que Madonna iniciara nos anos 80 e forçara na década de 90, continuado nos anos 2000 por uma artista negra, feminina e feminista.
“O concerto foi, aliás, um “statement” constante sobre a força feminina – selvagem, sensível, apaixonada, talentosa. A banda que acompanha Beyoncé nesta digressão é toda ela constituída por mulheres, cada uma com o seu espaço para brilhar a solo ao longo do espectáculo. Os homens só entram em palco para acompanhar a cantora em duetos ou para dar o contraponto masculino às coreografias certeiras”, destaca Silvia Pereira na reportagem publicada no Público.
Os preliminares são de ansiedade e incerteza mas o acto é de festa. O espectáculo irrompe com a fanfarra de metais de Crazy In Love, e a partir daí há medleys constantes e coreografias com rigor matemático a acompanhá-los. Ouvem-se Baby Boy, Beautiful Liar, Naughty Girl e uma evocação das Destiny’s Child na tríade Say My Name, Jumpin’ Jumpin’ e Survivor. Depois de ler cartazes da plateia, Beyoncé deixou um happy birthday a uma aniversariante de 16 anos. E ao fim de 29 cançōes, um Déjà-Vu despede-se até daí dois anos. Se foi o grande espectáculo da carreira de Queen Bey? Ainda não, mas foi um importante degrau na escadaria a caminho do trono.
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