Concertos com História #11 – U2 no Estádio de Alvalade (1993)
Os U2 subiram três vezes ao palco plantado sobre o relvado de Alvalade. Em 1993, 1997 e 2005. Três digressōes marcantes de três ciclos diferentes, mas seria a primeira a projectá-los como a banda mais influente da década de 90.
A 15 de maio de 1993, a Zoo TV esgotou o recinto onde então Balakov e Figo encantavam a torcida sportinguista. Era a época dos grandes concertos de estádio mas, paradoxalmente, o espectáculo esperou um ano até vir a Portugal porque a primeira manga decorreu em arenas e ainda não havia um Pavilhão Atlântico com a dimensão e infraestrutura técnica capaz de receber uma produção tão exigente e ambiciosa.
A Zoo TV traduzia o díptico Achtung Baby (1991) e Zooropa (1992), fundamental para compreender as deambulaçōes dos anos 90 – a sincronia entre rock e electrónica, o fascínio pela tecnologia, a alienação televisiva, a cultura do fragmento e o concerto rock redimensionado para um conceito de arte total (performativa, visual).
Nem todas estas representaçōes eram novas. Espectáculos como The Wall dos Pink Floyd já continham essa teatralidade sociopolítica na cultura rock mas nos anos 90, nenhuma outra banda como os U2 encontrou uma simetria tão perfeita entre vanguarda estética e mensagem para massas, transmitida em álbum e mediada ao vivo. Termos como multimédia eram o último grito e representavam o salto no desconhecido que assusta e fascina.
Desse período marcante, transportaram para o palco cançōes como Zoo Station, The Fly, Even Better Than The Real Thing, Mysterious Ways, Until The End Of The World ou Ultraviolet (Light My Way). Do passado pré-Berlim, onde ambos os álbuns revisitaram a atmosfera da trilogia Low, Heroes e Lodger, de David Bowie com o guru espiritual Brian Eno e o passageiro Daniel Lanois, recuperaram clássicos como New Year’s Day, Bad, Desire ou Where The Streets Have No Name. E ainda refizeram Satellite Of Love (Lou Reed), Unchained Melody (Righteous Brothers), despedindo-se ao som de Can’t Help Falling In Love, de Elvis Presley, recordava o artigo do DN publicado aquando da visita dos U2 em 2005
Tal como nos álbuns, a Zoo TV rompia com a tradição emocional dos concertos rock, e com o passado recente de americanização, no clássico Joshua Tree. Bono, The Edge, Larry Mullen Jr e Adam Clayton eram actores de uma grande encenação. Peças de um todo maior, transcendente dos limites físicos do corpo. O gigante videoclip de palco era como um caleidoscópio de cultura pop em que os U2 agiam como consciência colectiva de um futuro projectado com ansiedade e dúvida, como sempre acontece em momentos de transformação.
Naquele preciso momento, tudo bateu certo: era a música necessária para uma reinvenção individual de banda, lubrificada por uma mudança colectiva, transmitida com uma mensagem eficaz e um espectáculo ousado, e de custos elevados, que, para bem das finanças dos U2, esgotou em todo o mundo e bateu recordes de assistência. Os U2 residentes no The Sphere, em Las Vegas, entre setembro de 2023 e março de 2024, ainda tentam ser o que eram há trinta anos.
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