O pimba dá baile à pop

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O pimba dá baile à pop

 

Mike El Nite foi um dos primeiros rappers praticantes de trap em Portugal. Filho do popular cantor Quinzinho Portugal, nunca escondeu o grupo sanguíneo. Miguel Caixeiro, talvez por ter sido parte de uma primeira vaga que teve de enfrentar as dores crescimento de um som novo e lidar com o preconceito do próprio movimento, Miguel Caixeiro nunca deu o salto para a primeira liga, apesar de estouros como Mambo Nº1 ou Dr Bayard, ao contrário de Profjam que apadrinhou.

 

Em 2023, Mike El Nite e o neo-cantor romântico portuense João Não criaram o Bar Dançante, uma noite de “música popular” no Maus Hábitos sob o lema “dançar não é trair”. A festa recebeu convidados como Nel Monteiro, os Broa de Mel e Paulo Cunha Martins, o responsável pela descoberta e tráfico legal das cassetes de José Pinhal. Em vésperas dos Santos Populares, Mike El Nite foi convidado do novo single de Cláudia Pascoal, Três É Demais. Não veio só. A acompanhá-los, estava a cantora “pimba” Rebeca, apadrinhada por Ágata.

 

“A composição desta canção começou num lugar, no qual, onde só conversas importantes nascem: numa tasca. Eu pedi rissóis de camarão. E o Miguel pediu bifinhos. A partir daí foi magia. A Rebeca foi a colaboradora que ambos desejávamos há muito e finalmente o mundo colaborou para isso acontecer. ‘Três É Demais’ fala de uma hipotética relação com uma vontade de ser estendida para um terceiro elemento. Um é pouco, dois é bom, mas três já é demais”, explicou Cláudia Pascoal.

 

Em plena época de Santos, Bárbara Tinoco tirou bilhete e apanhou a popular Rosinha na estação do Pragal. Mal a provocadora Deixou-me a Mala no Comboio entrou nos carris, instalou-se entre as tendências digitais, chegando a estar entre os vídeos mais vistos no YouTube (actualmente é 20º). A letra fala por si. O testemunho conta o resto:

 

“Quando tinha 18 anos estagiei numa agência de música que agenciava artistas de música popular! Passei aquele verão todo a ouvir Rosinha. A ir beber deste género musical. A chorar de tanto rir com as letras, com os trocadilhos. Ficou óbvio para mim, que tinha de escrever uma canção assim antes de morrer. É difícil pra caraças mas é muito divertido tentar. Disse a mim mesma que ou gravava com a Rosinha ou não gravava”. E gravou mesmo.

 

A sincronia entre pop e popular fez de Preço Certo, de Pedro Mafama, um êxito intencional de baile gerado em ambiente sofistipop, no passado Para se assegurar que a canção chegaria ao país-real, Mafama não preparou apenas um golpe de mestre de comunicação ao estreá-la no programa de Fernando Mendes. O single já é por si um plano de marketing, desde o título, à letra e ao instrumental, até desaguar no posicionamento televisivo naquele que é provavelmente o programa mais transversal de toda a televisão portuguesa.

 

O enlace entre música pop e popular não é de todo novidade. Nos anos 80, António Variaçōes ou Carlos Paião não tiveram pejo em ir beber água às fontes populares onde se refrescavam nos verōes escolares. Já Zeca Afonso, Sérgio Godinho, José Mário Branco e Fausto trouxeram linguagens populares, rítmicas, líricas ou vocais, para a sua obra.

 

Durante anos, sobretudo nas décadas de 90 e 2000, a música popular sofreu de um preconceito que a sua pimbificação agravou. Há cerca de uma década, a série televisiva Deixa o Pimba em Paz, de Bruno Nogueira, humanizou os cantores populares sem lhes retirar a graça mas também sem os ridicularizar. Em paralelo, filmes como Meu Querido Mês de Agosto, de Miguel Gomes, trouxeram os bailes para o cinema independente. A reconciliação de uma nova geração segue uma corrente de águas quentes internacionais – as semelhanças entre Preço Certo e Despecha de Rosalía não são coincidência – mas ajudam a diluir o preconceito. Será paixão de um verão só ou amor para durar?

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