Concertos com História #8: Buraka Som Sistema no Coliseu dos Recreios

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Concertos com História #8: Buraka Som Sistema no Coliseu dos Recreios

 

Os Buraka Som Sistema não foram só a banda portuguesa mais transformadora deste século. Foram também aquela que mais demolidores concertos deu. Se foi em estúdio que o kuduro progressivo nasceu, como experiência laboratorial com o corpo em Luanda, a cabeça em Londres e o coração em Lisboa, era para em palco que a revolução se cumpria, com suor e alegria.

 

O concerto de apresentação do segundo álbum Komba a 10 de novembro de 2011 no Coliseu dos Recreios não vale como acto isolado. Responde pelo apogeu do grupo na simbiose entre criatividade e popularidade, e por noites memoráveis como a residência no Clube Mercado onde singles como Yah foram testados com sucesso, pela chamada a festivais como Roskilde ou Glastonbury, ou em Portugal as duas passagens pelo Sudoeste – a primeira à mesma hora dos Daft Punk! – e pelo Optimus Alive – em 2008, no final de uma noite esquizofrénica com Skunk Anansie, Bob Dylan e Evanescence -, e a segunda demolidora com LMFAO e Santigold.

 

É poucos meses depois deste último que o Coliseu abana o esqueleto ao som de (We Stay) Up All Night ou Hangover (BaBaBa), dois bons exemplos da transição de colectivo embaixador do “novo som de Lisboa” para banda de cartel internacional, com elos criativos de ligação entre África e o house universal. Como “banda do contra” (palavras de DJ Riot), a nova digressão arranca na sala magna de Lisboa, em vez de terminar como era norma até há poucos anos.

 

A formação já é aquela que fará mais quilómetros com Blaya como vocalista, e Fred Ferreira na bateria, a reforçar o núcleo-base formado por João Barbosa (J-Wow, agora Branko), Rui Pité (DJ Riot), Kalaf e Andro (Conductor). A noite é de êxtase e júbilo. A sala não enche mas aproxima-se, e confirma uma compreensão maior do fenómeno Buraka Som Sistema, depois de uma primeira fase de “adoro” ou “detesto” que faz do Som Sistema um caso de amor ou ódio.

 

São polémicos sem espalhar veneno. São políticos sem panfletarismos. Confrontam o instituído para propor uma nova realidade para a música criada em Portugal. Ainda estamos a anos de Slow J, Dino D’Santiago, Pedro da Linha, Julinho KSD ou Deejay Télio, mas a influência dos Buraka Som Sistema já faz mossa e tem expressão global, como se vê pela parelha com MIA em Sound of Kuduro.

 

Sem cerimónias, abrem com Hangover (BaBaBa) e instalam a festa na sala. O Coliseu vira clube. É uma celebração da banda, da cidade e do país. “Para todos os que estão connosco desde o Clube Mercado”, recorda a reportagem assinada por Vítor Belanciano no Público. Soltam Sound of Kuduro, Yah e Komba. O corpo vai perdendo a roupa, as calorias e os preconceitos.

 

A música dos Buraka Som Sistema une opostos, quebra barreiras, aproxima contrários. E traz também Sara Tavares em Voodoo Love, e Petty na famigerada Wegue Wegue. É a rendição absoluta no auge do ciclo internacional de um grupo que chega a fazer escalas entre Portugal, Europa e Japão em dias consecutivos. São concertos esgotantes de fervor e exaltação de uma identidade colectiva em reconstrução. Nunca se tinha ouvido nada assim, nunca se viu nada semelhante. Após dez incansáveis anos, interromperam a caminhada em 2016. Até quando?

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